PORTUGAL: OBVIAMENTE, EUROPEU.

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Se bem que nos falte quase sempre precisão para distinguir a dualidade do termo “Europa” – que usamos, de forma imprecisa, ora como definição de um “território multi-cultural” latusensu, ora como definição de “zona euro” – uma olhadela sincera ao país que temos não pode deixar de partir da admissão de que, muito do que  hoje chamamos a “civilização portuguesa”, depende, de forma simbiótica, da nossa adesão à Zona Euro. Estou a falar da rede rodoviária, do Sistema Nacional de Saúde, do Sistema Público de Educação, das ambições saudáveis que estes representam para 99.9% dos portugueses e da forma encontrada para os financiar – e legitimar – como pilares do Portugal do século XXI.


Sem querer fazer de conta que não há barreiras que separam o Norte do Sul do Continente – muitas das quais resultantes da Reforma de Lutero e da reformatação cultural subsequente – a verdade é que sou dos que prefere a dinâmica político-social das diferenças, à tábua-rasa das igualdades normativas. Ou seja, enquanto cidadão europeu, prefiro o choque produtivo como procura de equilíbrio entre Estados, à rejeição liminar – ora
pseudo-revolucionária, ora pseudo-conservadora, mas quase sempre inconsequente – dos euro-cépticos. Não gosto, no entanto, de cair na esparrela de achar que o debate sobre a Europa tem o seu Alfa e o seu Omega na comparação infeliz com a relativa falta de qualidade de vida de outros continentes.


Não; a Europa teve no pós-guerra um desígnio crucial com o qual tem, apesar de tudo, cumprido: a manutenção da Paz. O esforço tem sido esse; esse é o objetivo transversal e tem sido cumprido: o continente europeu atravessa um dos seus períodos mais longos de Paz na História, conseguindo, inclusivamente, suster alguns ímpetos nacionalistas perigosos nos últimos anos. Pelo meio, estão ideias seminais como o projecto Erasmus ou a livre circulação de pessoas e bens, que hoje começam a frutificar em termos da construção de um continente mais cosmopolita, livre e, portanto, economicamente saudável.


Sem complexos de inferioridade – já que Portugal pertence às “duas europas” por direito próprio, ou seja, à tal “zona euro” e ao tal “territorio multi-cultural” – seria bom, enquanto portugueses, relevarmos o que representou e representa a nossa condição de europeus. “Estar na Europa” não é um salvoconduto para soluções milagrosas; “estar na Europa” é habitar um território de exigência, responsabilidade e possibilidades infinitas.


Para nós, lusitanos, em particular, talvez seja mesmo o único antídoto para o isolacionismo a que a geografia – e as soluções paternalistas nela capciosamente fundadas, como o Estado Novo – nos quiseram votar. Falharam, e ainda bem; continuemos.

 

Por: Nicolau Pais

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