PARA ALÉM DA FOTOGRAFIA – DIA 14 El Chaltén (Miradouro dos Condores), Patagónia, Argentina

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Por detrás desta fotografia está a vida animal da Patagónia. Ou, pelo menos, uma tentativa de a encontrar.

Ainda que a viagem não se tenha marcado por uma busca incessante por vida selvagem, qual David Attenborough enviado em missão especial para a BBC Vida Selvagem, o nosso percurso ficou sempre marcado por uma atitude atenta, de ouvidos abertos e olhos em riste, no sentido de ver algo mais que paisagens. E a verdade é que, também nesse prisma, a Patagónia e as suas maravilhas naturais não deixaram de nos sorrir. Houve avistamentos de vida animal para vários gostos, ainda que algumas espécies, mais reservadas certamente, resolveram não dar um ar da sua graça ao longo destes dias.

Focas, leões marinhos e golfinhos em danças inebriantes na água, numa ondulação perfeita, que logo de início nos puseram a salivar e a imaginar o que mais iríamos conseguir ver ao longo dos vários braços de mar da Patagónia e da Carretera Austral. Ficaram por avistar baleias e orcas, criaturas mais difíceis por certo de encontrar, cujo mero vislumbre teria deliciado as vistas dos quatro viajantes que se atreveram a visitar o sul do Chile e da Argentina. Uma pena.

Qualquer referência à espécie canídea pecaria sempre por escassa, já que foram centenas os enormes cães de porte excessivamente elevado que por todo o lado andavam à solta, bem-humorados, sem trela nem dono, aproveitando o espaço dado pela natureza para esticarem as patas, sempre em busca de um carinho ou de um raio de sol que lhes permitisse dormir de pernas para cima e barriga para o ar. Que deleite!

Por cá não faltam ainda emus, enormes aves terrestres parecidas com avestruzes, que calmamente fazem companhia a inúmeras espécies de pasto que se espalham pelas vastas planícies apenas e tão só comendo, passeando e dormindo, como vacas, cabras, ovelhas e também coelhos. Tudo isto sem esquecer os milhares de guarnacos, camelídeos nativos da América do Sul semelhantes aos lamas, que nos foi dito se têm tornado uma espécie tão invasora, dada a velocidade com que procriam, que são atualmente uma séria ameaça ao ecossistema local. O resultado? Longas cercas colocadas com arame farpado a evitar que livremente passeiem de um lado para o outro da estrada, o que não demovendo parte deles leva a que centenas de carcaças jazam ao lado da dita cerca depois de tentativas desesperadas de a atravessar. Um cenário de morte para estes adoráveis animais. Uma tragédia.

A quantidade e diversidade de pássaros que pelo céu estendem as suas asas nesta zona do mundo é impressionante. Há pássaros para todos os gostos, e consequentemente há também sons e cantarolares para dar e vender. Pica-paus, pelicanos, colibris de tantas cores que até um arco-íris fariam corar, aves de rapina que ameaçadoramente planam sob nós, e condores. Muitos condores, os quais até têm direito a um miradouro precisamente com o seu nome, onde subimos e os avistamos de forma desafogada. Na Patagónia há tantas espécies diferentes de pássaros que à chegada a Punta Arenas, no aeroporto, nos deparamos com uma quantidade absurda de turistas a recolher o seu equipamento de fotografia em malas enormes e a dirigir-se para um sinal de tour que avisava, apenas, que ali se deveriam reunir aqueles que iriam fazer birdwatching. O que para uns, ornitofóbicos como eu, poderia ser um pesadelo, para outros é um motivo para marcar umas férias e reunir as maiores lentes fotográficas algumas vez vistas, apenas para tentar captar estas mesmas criaturas a bater as asas.

Ao longo dos nossos dias na Patagónia vimos muita vida selvagem, sim. Mas há sempre espaço para mais. Ficou por avistar um qualquer puma que, de barriga cheia, nada mais quisesse connosco que cruzar olhares, ou mesmo pinguins que por cá abundam e que, lamentavelmente, não conseguimos reservar o tempo para ir importunar. Mas a vida selvagem funciona precisamente desta forma. Nem sempre se vê o que anda por aí, porque não há forma de a controlar. Talvez por isso quando avistamos o que quer que seja fiquemos absolutamente deliciados. E está tudo bem assim. A simples possibilidade de eventualmente nos cruzarmos com alguma destas espécies no seu próprio ambiente, em sua casa, é, por si só, merecedora da nossa gratidão.

 

Por João Barros

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