RAIO GOURMETIZADOR

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ADORO BOLOS

Portugal é um país de pão bom, variado, consistente, por isso sentimos a sua falta quando viajamos, especialmente para a Espanha das baguettes sensaboronas ou para o Brasil do pão francês que ao fim de uma hora se torna uma excelente arma de arremesso. Isto apesar da ofensiva contra o sal, que retira uma parte do sabor, das farinhas de má qualidade, a fazerem pão que dá azia, e outros motivos que muito baixaram a qualidade geral do nosso pão, sendo ainda assim possível encontrar excelente pão por este país fora.

É neste país então que, aparentemente atingidos por uma febre consequente da música de Conan Osíris “Adoro bolos”, nos vimos invadidos por bolos em substituição do nosso belo pão. Não de bolos no geral, que a loucura não chegou a tanto, mas de bolos com origem na nossa ilha da Madeira, os agora omnipresentes bolos do caco.

Não há restaurante que abra, ou que dê um toque na ementa, que não inclua algo com bolos do caco. Eles entraram por aí qual tsunami e parecem não querer sair. Conseguir comer um prego – ou preguinho, como gosto de lhe chamar –, antes servido numa boa carcaça tostada, eventualmente barrada por manteiga, ou em bola de mistura, sem o inefável caco é hoje tarefa digna de um explorador
dos pólos que se arrisque a percorrer a restauração Lisboeta em busca desta raridade.
As tostas mistas em bom pão de mistura, de Mafra, saloio, ou até a versão que muito me apraz em carcaça, também elas sucumbiram ao caco. Sanduiches várias, acompanhamento para manteigas e outras entradas, enfim, lugares outrora habitados pelo pão, são agora terreno dos cacos. Tremo de pensar noutros terrenos a serem invadidos como o pão das sopinhas no molho à Bulhão Pato das ameijoas ser feito com caco, sem aquela capacidade de esponja que o pão verdadeiro tem. Talvez até bacalhau com bolo do caco, destronando a deliciosa broa, açorda de bolo do caco, a imaginação pode não ter limites o que me deixa bastante inquieto.

Felizmente ainda não a vislumbrei, mas não duvido que a próxima inovação gastronómica venha a ser a sardinha no bolo do caco, talvez acompanhada de uma espuma de pimento, fabricada por aquela marca de condimentos que inundou os santos populares Lisboa com as suas bandeirolas, mal deixando espaço para os mais tradicionais enfeites da época. Talvez sejam sinais dos tempos, mas era bom que não estragassem as sardinhas e os santos populares.
Não há restaurante que abra, ou que dê um toque na ementa, que não inclua algo com bolos do caco. Eles entraram por aí qual tsunami e parecem não querer sair. Conseguir comer um prego – ou preguinho, como gosto de lhe chamar –, antes servido numa boa carcaça tostada, eventualmente barrada por manteiga, ou em bola de mistura, sem o inefável caco é hoje tarefa digna de um explorador dos pólos que se arrisque a percorrer a restauração Lisboeta em busca desta raridade. As tostas mistas em bom pão de mistura, de Mafra, saloio, ou até a versão que muito me apraz em carcaça, também elas sucumbiram ao caco. Sanduiches várias, acompanhamento para manteigas e outras entradas, enfim, lugares outrora habitados pelo pão, são agora terreno dos cacos. Tremo de pensar noutros terrenos a serem invadidos como o pão das sopinhas no molho à Bulhão Pato das ameijoas ser feito com caco, sem aquela capacidade de esponja que o pão verdadeiro tem. Talvez até bacalhau com bolo do caco, destronando a deliciosa broa, açorda de bolo do caco, a imaginação pode não ter limites o que me deixa bastante inquieto.

Com tudo isto, pobre do nosso pão. Andam os pães de Mafra desesperados, as broas de milho tristes e desamparadas, mas, acima de tudo, as carcaças deprimidas. Deveriam ser já criados centros de terapia para a carcaça, porque o trauma parece que irá agravar-se e os cacos ameaçam não parar de colonizar os terrenos outrora ocupados pelo nosso bom e honesto pão. Por isso, dedico ao nosso pão, em particular às carcaças deprimidas, os seguintes versos de Conan Osíris:

“Eu adoro bolos
Mas eu amo-te mais a ti
Eu adoro bolos
Mas adoro mais a ti.”

 

Por: Pedro Nápoles

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