Uma Bica e dois dedos de conversa com Sandra Pereira

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Em plena quarentena, e estado de emergência, estive à conversa – na medida do possível, tendo em conta o cenário actual – com Sandra Pereira, cantora e intérprete, dona de um registo vocal invejável e de uma sensibilidade especial para a música, no geral. Falámos de tudo um pouco, desde os primórdios do seu fascínio por esta arte, passando pela sua evolução e pelas suas experiências e vivências, culminando em mais uma etapa da sua carreira, onde nos fala dos seus projectos para o futuro e também da sua nova música e vídeo (onde, aliás, tive o prazer de participar, a convite da nossa entrevistada), que tem servido como um símbolo de esperança para todos aqueles que desejam o fim deste momento menos bom…

Como e quando surgiu este teu gosto pelo canto e pela música, no geral?

Penso que o gosto pela música vem de muito cedo. Lembro-me de ser muito pequena e estar em cima de uma cadeira, onde o meu pai me punha, com uns phones ligados a uma aparelhagem, a ouvir os discos dele. Isto na década de 80.
Na escola, sempre participei em quase todas as actividades que tinham a ver com dança, teatro ou música. Sempre me senti muito confortável em cima de um palco, com público. Sentia-me feliz, genuinamente feliz.
Quando entro na Universidade, juntei-me quase de imediato a uma tuna, onde aprendi a tocar guitarra. Penso que, nesse momento, foi quando eu realmente percebi que a minha vida passava pela música. E assim permanece até aos dias de hoje.

Quais são as tuas maiores influências? Quem, e/ou o quê, foi essencial na tua evolução?

Quanto às influências, é difícil indicar só um ou dois artistas ou pessoas que me tenham influenciado, porque o percurso já conta com cerca de 15 anos, e, ao longo da minha evolução, foram diversas as influências nas minhas composições e até na minha interpretação. Mas serei, sempre, uma grande fã dos anos 80, no melhor do seu rock e pop. Assim como dos 70’s, com o seu funk e soul, dos 90’s e 00’s, com aquele pop teenager e, até, aquele grunge bem característico. De uma forma geral, em todos os géneros musicais, em todas as décadas, existem músicos, riffs, melodias e concertos que me influenciaram até aos dias de hoje e cuja essência é absorvida para que possa evoluir.

De Albergaria-a-Velha, foste para Viseu, onde te envolveste em alguns projectos musicais. Conta-nos um pouco sobre essa fase…

Ao entrar na faculdade, em Viseu, descobri, numa das minhas saídas, um tasco bem popular na cidade, que juntava uma grande fatia de músicos que estudavam ou viviam na cidade. Lembro-me de um grupo de raparigas, com os seus instrumentos, a cantar e a tocar músicas bem tradicionais, num canto do “Boquinhas”, e lembro-me de sentir que queria fazer parte daquilo. Como normalmente não sou uma pessoa envergonhada, fui logo ter com uma delas, e perguntei se era possível fazer parte da tuna, e que gostava muito de cantar, mas que não tocava nenhum instrumento. Passadas umas semanas de estar na tuna, decidi que gostaria de tocar guitarra, porque eu gostava de escrever e achava que, tendo uma guitarra, era mais fácil compor originais para o nosso grupo. E assim foi, durante 5 anos. No entretanto desse tempo, fiz parte de uma banda de covers de rock, “Miss Fabs”, onde cresci bastante, enquanto artista e intérprete. Fizemos muita estrada, e o bichinho estava bem alimentado, mais instalado do que nunca. E, a partir daqui, era isto tudo a minha vida. Em 2010, decido inscrever-me no programa “Ídolos”, com o sonho de me tornar numa artista a sério, maior.

Ora então, pouco depois, em 2012, saltaste para a ribalta, invadindo os ecrãs dos portugueses, através daquela excelente prestação, e consequente vitória, no programa Ídolos da Sic. Como recordas essa experiência e de que maneira mudou a tua vida pessoal e profissional?

É engraçado voltar 10 anos atrás e lembrar-me do que movia o meu coração naquela altura, porque achamos que há muita coisa que muda com o passar dos anos, e isso não mudou dentro de mim. O sonho permanece o mesmo, mas com muito mais noção da realidade, até porque a experiência também é maior. A nível pessoal, mudou a minha percepção sobre a nossa capacidade de adaptação, a situações completamente diferentes das habituais na nossa vida. Naquela altura, também vivi o expoente da minha auto confiança, segurança e estima, e realmente é incrível (quase mágico) o que conseguimos fazer quando nos sentimos bem e orgulhosos de nós mesmos. A nível profissional, foi um período muito bom. Fiz trabalhos e colaborações magníficos. Desafios e recompensas muito bons, que me permitiram também fazer contactos importantes.

E a tua experiência por Londres, como foi?

Londres é uma cidade intensa. Para mim, intensa em quase todos os sentidos. Gosto muito da cidade, mas não morri de amores por ela. Não gostei de viver numa cidade cheia de gente e de tanto distanciamento entre pessoas. Talvez porque a nossa cultura lusitana seja o oposto. Não me consegui habituar muito bem a essa dinâmica britânica. Quanto ao que tem para ver e fazer, é sem dúvida uma cidade com um cardápio bem variado e apetitoso. Culturalmente, é super rica e interessante. Não gostei nada da comida, até porque, para que conseguisses comer bem (aquilo que nós, portugueses, tão bem sabemos), era preciso que também pagasses melhor. Quanto à escola, foi uma experiência interessante. Conheci muitas pessoas, de vários sítios do mundo, que partilhavam os mesmos sonhos e ambições que eu, de alunos a professores.

Agora a Sand…Conta-nos um pouco sobre ela, o que esperas desta tua nova etapa e quais os teus projectos e ambições futuras?

Sand é só um pseudónimo, assim como já tive ou fui uma Jahde. Eu sou a Sandra Pereira (assim foi como fiquei conhecida), e, à medida das minhas criações, vou lhes dando os nomes que me surgem. É importante para mim, na minha visão, reinventar-me e superar desafios, e até desilusões, com criatividade, e dizer (na música) o que me vai na alma, através da minha voz, expressão corporal e letras. Sand surgiu numa altura difícil, em que posso dizer, usando a precisão da palavra “literalmente”, que andava com a cabeça enterrada na areia. Surgiram várias canções, nesta fase, que irão fazer parte de um disco que vai contar várias coisas sobre mim, a minha vida e o meu espírito crítico e revolucionário. Não tenho data para lançamento, mas, em breve, lançarei outra música, assim que esta calamidade acalme.

Em relação a esta nova música, e vídeo, que lançaste, ‘Stay Safe, Stay Home’, como surgiu a ideia e como foi o processo de elaboração?

Esta música surgiu de uma ideia melódica que tive, quando tomava banho. Assim que nos foi dito que deveríamos ficar em casa, pensei logo que, possivelmente, teria de criar umas sessões de música, em lives e vídeos, para todos os que estivessem em casa. E há um dia que, no banho, me surge uma melodia. Corri para o telemóvel, para gravar a ideia, antes que me esquecesse. Falei com o meu namorado (Eduardo Espinho), que foi quem fez a produção do tema, juntamente com o Miguel Teixeira, e começámos a montar a “coisa”. A partir daí, foi pedir, a todos os músicos envolvidos, que gravassem, a partir de casa, para o vídeo. Decidi juntar vários amigos, para fazerem parte dele, a partir das suas próprias casas. O tema, como o próprio nome indica, é um apelo a que fiquemos em casa, apesar da falta de paciência e, também, apesar do desconhecido. Temos de ter esperança que iremos conseguir voltar ao normal, porque é a forma como sinto todo este momento. Este é um tema extraordinário, no sentido de que não fazia parte do alinhamento do meu disco, mas aproveitou este momento, e a minha ideia, para apresentar o meu novo projecto.

Umas últimas palavras de conforto e esperança para quem nos está a ler, tendo em conta estes tempos de incerteza e reflexão que vivemos actualmente.

Os tempos que vivemos agora são de incerteza, desconforto e até medo. Várias teorias nos surgirão na cabeça. Haverão dias em que a paciência se irá esgotar tão rápido quanto uma gota de água evapora, numa temperatura de 40 graus. Mas temos de manter a serenidade e a confiança nos nossos profissionais de saúde e até nos membros do governo. Mas é certo que depende essencialmente de nós, de conseguirmos controlar a propagação desta doença, sendo que, a meu ver, ela atingirá grande parte de nós, uma vez que ainda não existe uma vacina e a sua forma de contágio é tão simples e rápida.

Vamos passar este teste, sem dúvida, com todas as consequências inerentes à situação. Mas é muito importante que mantenhamos a calma e que nos informemos devidamente, para que seja mais fácil enfrentar tudo o que ainda está para vir. Também penso que é o momento de reflectir sobre diversas coisas que deixámos por fazer, na nossa família, e o quanto vivemos distanciados uns dos outros. Há sempre uma bonança depois de uma tempestade. E isso é uma certeza. Temos de manter aí o nosso estado de espírito. Desejo, a todos, saúde e paciência.

Por Gustavo Homem

 

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