Saudades

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DO BRASIL EM PORTUGAL

 

Não precisa viver muito tempo em Portugal para entender que nós zucas demos uma pequena alterada nas coisas que aprendemos com os tugas. O rebuçado virou bala, a boleia daqui é a carona de lá e corrupção que também tem aqui, virou uma grande festa de lavagem de dinheiro em terras tupiniquins.

Não tenho nenhuma dificuldade em compreender essas sutilezas e colocar algumas em prática. Minha única questão é a relação conturbada com o “Eu te amo”. Digo conturbada porque é impossível entrar na minha cabeça.

A primeira vez que me deparei com essa relação complexa dos portugueses e “eu te amo” foi assistindo um filme. Essas comédias românticas que são tão ruins que você assiste com um olho na televisão e o outro no celular. A personagem disse “I Love you” e na legenda apareceu “Eu gosto muito de ti”. Na hora dei uma risada de canto de boca e pensei com meus botões “depois brasileiro que não sabe falar inglês”.

A vida seguiu com a minha pessoa achando que era um pequeno deslize do tradutor.

Até que um belo dia me deparo mais uma vez com essa emblemática luta dos portugueses com o amor.

Nessas andanças pelo Porto, fiz um amigo que havia acabado de terminar um namoro de 7 anos.  Papo vai, papo vem e ele me confessa “Nunca disse a frase eu te amo para ela, sempre disse: gosto muito de ti. É a mesma coisa.”.

Minha cara perplexa fez com que trocássemos de assunto rapidamente, afinal estava com uma mistura de expressões de depressão profunda com uma leve revolta digna de dizer “que porra é essa, meu irmão”.

Para nós brasileiros, o “eu te amo” é uma das etapas da relação. Você começa falando que gosta ou adora a pessoa e quando o sentimento faz com que você perca o ar, o “eu te amo” sai com facilidade da boca.

Lógico que algumas vezes rola aquela situação que você diz um “te amo” e recebe aquele silêncio constrangedor e um sorriso sem graça. É aquele velho ditado “Houston, We got a problem”.

Ainda assim nada justifica não dizer eu te amo. Por isso, tive que levar essa questão a um outro amigo português. Sim… sou brasileira e não desisto nunca!!!

E para minha revolta ele concordava. Foram longas horas de debate e que até hoje não conseguimos chegar a lugar algum.

O argumento final dele sempre é “Amo-te não é bonitinho. O problema está no pronome.” Meus caros leitores, o amor não tem regras. A gente ama uma pessoa do outro lado do oceano, ama quando o timming não parece certo, ama até sem querer amar.

Que se dane os gramáticos, quem liga para eles?! Vocês esqueceram que foram eles que criam esse acordo ortográfico que até hoje ninguém entende????

Por isso, amados portugueses vamos jogar esse pronome para o escanteio. Quando o olho brilha e as borboletas voam compulsivamente no estômago, ninguém vai pensar nessas regras. Não existe Bossa Nova, Amália Rodrigues ou o novo CD do Arctic Monkeys que consiga superar a beleza de um “Te amo”. Não importa se é desafinado, tímido ou escandaloso. A terra para, o coração acelera, o riso fica frouxo. São alguns segundos em que tudo faz sentido.

E se o amor perdoa tudo, fiquem tranquilos, esse errinho gramatical vai passar batido. Então não se preocupem. Apenas experimentem.

Vamos só nos amar.

Ei, não esquece…

Te amo Portugal!

 

Por: Valentina Carvalho

Ilustração: Tiago Lopes

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