Saudades DO BRASIL EM PORTUGAL

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Cai de paraquedas na vida de solteira. Se fosse no meu Rio de Janeiro, seriam algumas lágrimas derramadas, mas nada que alguns chopps à beira da praia ou um sambinha para arranjar o próximo ferte. Mas o cenário era outro. Estava em recém chegada em Portugal, ainda no processo de fazer novos amigos, cursando um mestrado.

A brilhante solução foi se jogar no Tinder. Entre alguns matches ousados que cismam que somos putas, encontrei 1 possível pretendente para sair. Parecia gente boa, inteligente, havia terminado um namoro longo e deixou claro que não queria nada. Achei ideal, tendo em vista que minha cota de emendar relacionamento já está estourada. Quando parecia que ia rolar o encontro, eis que ele desmarca. Não seria possível porque teria que ir de óculos de grau, porque faria uma intervenção nos olhos na semana seguinte. Isso mesmo caros leitores!!! UM ÓCULOS DE GRAU. No meu Rio de Janeiro, as pessoas se encontram com purpurina, com sal no corpo e areia no pé.

Mesmo estando fadado ao fracasso, marcamos um outro encontro um tempo depois. Estava tudo correndo bem, até que me perguntou quantos namorados já tive. Ele levou um susto quando disse que já tive 5 namorados. Me senti aqueles animais exóticos em zoológicos que todo mundo fica encarando, só faltou uma selfe para guardar de recordação. Sua reação deixou claro que ele não tinha experiência e que eu era vivida demais para os padrões de uma cidade do interior
Saímos por mais um tempo, ele é um querido. Mas era evidente que eu não combinava com a mentalidade da cidade dos padres e que eu já estava morrendo de saudade da malandragem.

O próximo passo então foi seguir para noite.
Um amigo me alertou que aqui em Portugal podem te barrar para entrar numa discoteca se acharem que está mal vestida. Então coloquei um salto e fui. Péssima escolha… me senti a Branca de Neve no meio de vários anões com topetes no melhor estilo Cristiano Ronaldo.

Mesmo me sentindo o Everest da discoteca, um pequeno tuga veio conversar comigo. Disse que eu era linda e pediu meu instagram. Se no Rio eu ganho beijos, aqui ganho seguidor. Ficamos conversando e tudo ia bem, até que sinto a sua mão na minha bunda. Congelei de raiva… Onde já se viu, não ganhei nem um beijo, mas a minha bunda virou apoio da mãozinha dele. Achei um abuso, mas não disse nada.

Por sorte, já estava tarde e queria ir embora. Então discretamente fz um movimento meio matrix para tirar a sua mão e me despedi.
NADA DE BEIJO. No dia seguinte me chamou para um café. E para minha surpresa, realmente ele pediu um café. No Rio a gente pode até chamar para um café, mas a probabilidade de iniciar em um chopp é enorme. Mas em Portugal ficamos no café. E nem se animem achando que rolou beijo… Porque aqui a dinâmica é outra…

Depois de algumas situações como essa, entendi como as coisas funcionam. Fazem dessa vida de encontros quase um jogo de vídeo game na encolha. A primeira fase é conseguir um instagram. Se tiver interessado mesmo, passa para a segunda a fase: coloca uma mão na bunda. É sinal de interesse, mas discreto, sem queimar o filme beijando na noite. Faz total sentido agora, afinal estamos numa cidade bem menor que o Rio de Janeiro, e certamente você vai cruzar com as mesmas pessoas sempre. A terceira fase é o bendito café. Se o papo fluir, a situação evolui e vamos para a quarta fase: você é chamada para um jantar. Por fim, se chega ao chefão, e finalmente você consegue um beijo. É… Os português são é espertos, comem quieto.

Mas nem tudo tem essa dinâmica. Ainda bem, se não já estaria trincada de tanto cafeína no meu sangue.  Nessas andanças por essa cidade de ladeira, cruzei com o tuga mais zuca que conheci. Daqueles que chamamos de cafa, o apelido carinho para os cafajeste. É aquele que senta no bar cheio de si, dono da porra toda. Me olhou com aquele ar de quem sabe o que é capaz e só mexendo levemente a cabeça me chamou para dançar um forró. Não tive como rejeitar.

Na pista, os casais dançavam numa grande performance do Cirque de Soileil… Aquele estilo que eu danço com amigos gays. Roda para lá, para cá, desce, sobe, puxa daqui, enrola dali. Um jeito que não aconselho para quem já bebeu um pouco a mais. Mas meu cafa, é raiz. Dança coladinho, coxa com coxa, sussurrando a letra no meu ouvido. Só pensava, já era… passamos a noite assim, dançando e no fim, como um bom cafa, um beijo me deu. Trocamos telefone e ele foi embora. Sua primeira mensagem para mim foi “um beijo na boca”. Gamei… Marcamos um almoço e logo disse que a sua casa tinha a melhor vista da cidade. Nesse momento todas as minhas esperanças dele não ser mulherengo acabaram ali. Com essa frase, havia ganho o título de tuga cafajeste do ano. Apenas ri, e prometi que quem sabe um dia iria conferir. Tinha que me fazer de difícil.

Depois de alguns encontros acabei não resistindo as suas investidas e fui que verificar se era a vista mais bonita da cidade. E ele tinha razão. Douro, pele com pele, Chico ao fundo. Aquele combo. Deu samba. Tentei ficar o máximo possível admirando aquela vista, afinal como todo bom cafa, sabia que iria sumir. E não teve outra. Sumiu… A sorte no amor ainda não chegou. Chegou apenas o amor por esse país que me encheu de carinho e amizades. Já o coração, por enquanto continuo nessa entre cafés e chopps.
Ou melhor… Garçon… desce um príncipe, por favor!

Por: Valentina Carvalho
Ilustração: Tiago Lopes

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