O que é um prazer?

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Segundo os dicionários, é muitas coisas. Sentimento agradável que alguma coisa faz nascer em nós, deleite, gozo, delícia, gosto, desejo, alegria, contentamento, boa vontade, agrado, distracção, divertimento.

Para os hedonistas, a busca do prazer deve ser o fio condutor da nossa vida, das nossas acções. Só essa busca, e a obtenção do prazer, nos trarão a felicidade. O prazer é o bem supremo. Acreditar nisto pode ser um pensamento agradável, mesmo um prazer. Mas, infelizmente, não é verdade. Os prazeres que experimentamos são, muitas vezes, talvez as mais das vezes, uma consequência não prevista das nossas acções. Não devem ser, não são, o resultado de uma busca. Até porque, se fizermos das nossas vidas uma busca constante do prazer, prevejo muita frustração e infelicidade.

Felicidade e prazer são conceitos subjetivos e estados de alma ou até físicos limitados e finitos. Um exemplo claro: para os fumadores, fumar um cigarro dá uma sensação de prazer que, no segundo seguinte, se esgota e é arrasada pela noção do erro que é fumar. Palavra de ex-fumador. Os prazeres consomem-se a si próprios, ficando como pano de fundo aquilo que leva à sua obtenção.

Outro exemplo, mais poético. Pode existir um prazer, há claramente muitas vezes um prazer, em não cumprir um dever. Uma certa – e momentaneamente agradável, sem dúvida – sensação de liberdade. Mas, se é mesmo dum dever que se trata, estamos apenas a procrastinar, ou mesmo a negligenciar uma obrigação, e sobrevirá a culpa e a ansiedade provocada pelo dever não cumprido. Os prazeres não se compadecem com buscas, são sobretudo consequências que não devem ser antecipadas, sob o risco de as expectativas serem frustradas, e lá se vai o prazer.

O prazer é apenas a sensação que fica, depois de tudo. Uma sensação, apenas isso. Tão leve e volátil como o cheiro dum bom perfume. E provavelmente, ainda que se procurem recriar as mesmas exactas circunstâncias em que se sentiu um prazer pela primeira vez, ele será irrepetível em todos os seus contornos. Pode aumentar, ou diminuir, ser mais ou menos intenso, mas um prazer nunca será exactamente igual a outro, do mesmo género e grau, que tenhamos sentido.

O que fica é sempre uma sensação. E isto, uma sensação, apenas uma sensação, não pode ser o fio condutor das nossas vidas. O prazer esgota-se em si próprio. Saibamos apreciá-lo, quando ocorre e enquanto dure. Guardemos a memória da sensação que nos percorre. Porque nunca mais voltará a ser igual. Todos queremos ter prazer em tudo o que fazemos e sentir prazer em tudo o que nos rodeia e isso não tem nada de errado, é uma ideia feliz. Mas temos de saber que o prazer é caduco.

E que o fio condutor da nossa vida tem de ser perene.

 

André Serpa Soares

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