MAJORA

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Oito décadas a juntar pessoas

Muitas décadas antes do aparecimento da internet e até da televisão, num tempo em que o mundo nos entrava porta dentro pelas ondas hertezianas da rádio, os serões em família, sobretudo nas longas noites de Inverno, eram passados entre conversas e jogos tradicionais, de que hoje nos resta só a memória.

Foi por essa altura, no exacto ano em que a Europa mergulhava no flagelo da II Guerra Mundial que, inspirado numa viagem que fizera à Alemanha, onde tinha descoberto divertidos jogos de tabuleiro, Mário José Oliveira começou a desenhar jogos na cave de casa dos seus pais, na Avenida Boavista, na cidade do Porto. Estava criada a Majora, a marca portuguesa de brinquedos, que marcou o imaginário de gerações.

A Majora, cujo nome é inspirado no do seu criador – MArio JOrge OliveiRA -, consolidou o estatuto de marca de referência no divertimento para as crianças com jogos como Pontapé ao GoalJogo da GlóriaLoto ou O Sabichão que, criado em 1962, foi uma figura de destaque no seu catálogo. D’ O Sabichão fazia parte um boneco de madeira, pintado muitas vezes pela família de Mário, após o jantar. Com destreza, o mesmo colocava dois pincéis numa mão, pois assim conseguia pintar duas cores ao mesmo tempo; da tinta preta nasciam os olhos, a boca e o nariz.

A criação dos jogos era sempre feita com muito secretismo no departamento de Invenções da Majora. O desporto foi a inspiração para jogadas de dados que ficaram na memória: Volta a Portugal em BicicletaRally Automóvel ou Corridas de Cavalos, títulos que marcaram uma época. Além dos jogos de tabuleiro, brincadeiras didácticas e desafios de destreza, a Majora teve ainda brinquedos, livros infantis e puzzles. Jogos simples e que as famílias podiam jogar em conjunto.

Valorizando a criatividade e qualidade dos brinquedos, a Majora trabalhou directamente com vários criativos e ilustradores, como Gabriel Ferrão, que desenhou centenas de tabuleiros, e a ilustradora Laura Costa que contribuiu para a ilustração da emblemática Colecção Princesinha entre outros títulos. As temáticas dos mais de 300 jogos didácticos categorizavam-se entre desporto, geografia, História de Portugal e a cultura portuguesa.

Apesar das mudanças sociais do início dos anos 70, do aparecimento da televisão e, mais tarde, da internet, que quase remeteram os jogos de tabuleiro para um rodapé na história do entretenimento familiar, a Majora manteve-se em actividade, nunca deixando de apostar na inovação e na função didáctita dos seus jogos.

Em 2015 deixou de ser um negócio familiar e foi relançada com uma nova gestão através do investidor José Luís Pinto Basto e sob a direcção geral de Catarina Jervell. Renovada na sua mensagem, logótipo e portfólio, a Majora conta agora com 40 referências familiares modernizadas como o Jogo do Stop!, Mayoga ou a primeira referência para adultos, o ORAL.

Neste tempo, em que jogar é cada vez mais uma experiência virtual, individual e não presencial, os jogos de tabuleiro continuaram a ser um agregador de pessoas, porque além das ligações virtuais, promovem ligações humanas. É através do brincar que as crianças se desenvolvem enquanto seres humanos e aprendem a gerir as suas emoções. As áreas do nosso cérebro responsáveis por esta gestão estão interligadas com as competências funcionais de tomada de decisões, resolução de problemas e capacidade de seguir regras.

Brincar não é uma opção, é um processo fundamental no desenvolvimento das crianças para se auto-descobrirem e aprenderem a relacionar-se com os seus pares. Setenta e nove anos depois de desafiar as crianças a brincar, a Majora mantém a sua missão de promover as relações humanas através da brincadeira, combatendo a tendência de “brincar isolado”, num misto de aprendizagem, diversão, partilha e criação de momentos felizes e memórias únicas entre familiares e amigos. 

Os benefícios da brincadeira passam pelo desenvolvimento de fantasias e de sonhos, de aprender a superar desafios físicos e psicológicos e da aprendizagem do que é o consenso: brincar é um acto voluntário. Para muitas crianças a gestão emocional é uma tarefa mais difícil que aprender matemática. Aprende-se a esperar, a partilhar, a ganhar e a perder. As crianças aceitam as derrotas se se sentirem seguras, caso contrário, refugiam-se em brincadeiras ou actividades onde não se sentem julgados ou não há como perderem. Brincar deve ser uma fonte de felicidade.

Brinquedos VS Tecnologia é uma dicotomia que os nativos digitais não compreendem. Para eles tudo são brinquedos. Os sinais de alerta para o abuso de tecnologia devem ser considerados quando somos confrontados com as dificuldades das crianças em exercitar a função de escrita porque não têm força para agarrar no lápis, ou atrasos na linguagem provocados pela falta de aprendizagem num contexto dual, de troca de informação e a falta do toque, de atirar, de pegar, de deixar cair. As crianças não têm acesso, sozinhas, à tecnologia. O uso regrado terá os mesmos benefícios que outras interacções que nos são prazerosas ou desafiam.

Uma agenda preenchida em actividades extracurriculares que esvazia o espaço de brincadeira é tão preocupante como a adição da tecnologia. As crianças gostam de brincar e de passar tempo com os seus pais. Se os pais e educadores desafiarem e se envolverem, os jogos tradicionais revelam todo o seu potencial de entretenimento.

E o envolvimento dos pais e educadores é fundamental para o desenvolvimento das crianças: a recompensa do esforço, de recomeçar sem se ter terminado a tarefa e tirar prazer do acto de brincar com a criança, valorizando o acto de brincar.

 

Tem sido esse o papel da mítica Majora ao longo de gerações.

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