Revista Bica nº4 – Ebook

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Descrição

Possivelmente, todos nós, nas terras da Europa, nos parecemos. Temos uma sensibilidade comum perante a vida e as suas mudanças. O que mais nos agrada é inventariar as coisas do progresso para não nos iludirmos com ele. Mas, acima de tudo, amamos tudo aquilo que afinal não está na agenda da celebridade. Amamos os quatro favores da pobreza, que são: o humor, o vínculo ao quotidiano, o respeito pela morte e por tudo que a pode atrasar ou activar. E amamos os caminhos da terra que percorremos sem descanso, mesmo quando somos obrigados a um ofício sedentário.

Agustina Bessa-Luís, in Dicionário Imperfeito, Guimarães Editores, 2008

A primeira vez que ouvi falar da Europa devia ter uns quatro anos e foi no dia em que recebi o meu primeiro globo. O globo era uma bola grande e muito azul, cuja função, por qualquer razão que me fugia ao entendimento, não era a habitualmente dada a todas as bolas, mas antes ficar parada num equilíbrio instável, meio inclinada, em cima da secretária do meu pai. Nesse dia, aprendi que o globo representava o mundo, e no mundo ficava a Europa, e na Europa, Portugal. Eu não conhecia o mundo, nem a Europa, nem Portugal. Em abono da verdade, nem Viseu, aonde o meu pai ia todos os dias e pelos vistos também ficava nesse tal de mundo. Nessa época, o meu mundo resumia-se à casa onde vivia e às vinhas em volta que se espraiavam encosta abaixo, até perder de vista.

Uns tempos depois, fui a Viseu e mais tarde à Europa, ou melhor, a Espanha, que é como quem diz a Salamanca, num passeio de família tão atribulado pelo mau tempo que dele só recordo os gritos de pânico da minha avó intercalados por preces pungentes a São Cristóvão para que nos guiasse sãos e salvos pelo caminho de regresso.

A Europa de verdade, para lá dos Pirinéus, conhecia já adolescente nos livros, em muitas viagens imaginárias, e só muito depois, já na idade adulta, ao vivo e a cores, num tempo em que ainda nos tínhamos de abastecer, antecipadamente, de pesetas e francos, de liras e de marcos e tratar do passaporte no Governo Civil com pelo menos um mês de antecedência, não fosse o “diabo tecê-las”.

Confesso que gostei da Europa e gosto de dizê-lo assim, abrangendo num todo indefinido uma quantidade enorme de países, a maioria dos quais não conheço. E gosto de dizê-lo assim, porque o que me encantou na Europa foi exactamente a riqueza da sua diversidade.

É dessa Europa que falamos nesta edição da Bica.

Uma Europa multicultural e multirracial, aberta ao mundo há mais de seis séculos atrás pela mão dos portugueses e que hoje se habituou a acolher esse mundo que desbravou, como nos explica a Representante Especial das Nações Unidas para a Migração Internacional, Louise Arbor; uma Europa integradora e solidária, que acredita que os refugiados não são uma multidão, “um mar de gente”, uma categoria a ser tratada como um todo, mas antes seres humanos, indivíduos, nossos irmãos e irmãs, com rostos e histórias para contar, como insistem em explicar José Farinha e Marianne Syed através do Projecto Odisseia; uma Europa decidida em preservar com orgulho o seu património cultural, de que nos fala Guilherme d’Oliveira Martins; uma Europa cientificamente inovadora e tecnologicamente pioneira, de que se orgulha o nosso Comissário Europeu Carlos Moedas; uma Europa plataforma de partilha de experiências de agentes culturais, como promovido pelo ousado Projecto Parallel, idealizado e concretizado pela Procurarte com apoio do Programa Europa Criativa da União Europeia; uma Europa olhada a norte pela mão da Rebecca Abecassis.

Pelo meio, conversamos com Pedro Santos Guerreiro, director do Expresso sobre a Europa, Portugal e muito mais; levantamos o véu sobre a próxima edição do NOS Primavera Sound, sobre o Indie Lisboa e sobre a nova exposição temporária patente no Palácio Pimenta – “Lisboa, Cidade Triste e Alegre: Arquitetura de um Livro” – que revisita a obra homóloga de Victor Palla e de Manuel Costa Martins recentemente reeditada pela Editora A Bela e o Monstro em parceria com o Jornal Público.

Esperamos que gostem.